terça-feira, 30 de junho de 2009

Empacada como está, a educação brasileira nem merece esse nome. É uma fábrica de desencorajados e, portanto, propensos à depressão, às patologias

A escola no Brasil tem de mudar muito - e rápido (Artigo)
29-Jun-2009


Empacada como está, a educação brasileira nem merece esse nome. É uma fábrica de desencorajados

Paulo Rabello de Castro - ÉPOCA

O Brasil anda otimista. Pudera! Ante o estrago geral provocado pela crise econômica mundial, nosso país desponta como nação líder. O presidente Lula voltou radiante da reunião dos Brics - Brasil, Rússia, Índia e China. Tudo parece conspirar a favor. Inclusive pelo calendário da Copa do Mundo de 2014 e, quem sabe, das Olimpíadas de 2016. Para os otimistas, nossa mão já está no caneco. Andamos, sim, redondamente enganados.

País monoprodutor de "commodities" que viramos, e de semiescolarizados, só temos chance de destaque quando os times adversários pegam uma gripe forte. Na banca de exame ou no banco da escola, a disputa da lanterninha continua nosso esporte predileto.

O balanço da educação brasileira, do berço à beca, persiste para lá de duvidoso. No campo do "aprendizado", fabricamos alfabetizados disfuncionais, gente que até consegue ler, escrever e somar, mas, por favor, não lhes peçam para soletrar, relacionar ou tentar elucidar uma questão. Escolas disfuncionais - com "problemas sérios de função", pois não sabem por que existem - produzem diplomados incompatíveis com as necessidades do mercado e com as demandas do mundo do futuro. Para Miguel Nicolelis, destacado neurocientista brasileiro radicado nos Estados Unidos, onde dirige o Centro de Neuroengenharia da Universidade Duke, "se estivesse na situação de um jovem hoje, pensaria muito antes de ir para a universidade. Ela precisa mudar demais. As divisões (curriculares) são do século XIX". O que Nicolelis disse na sabatina da Folha de S.Paulo (10/6/09, página A16) mereceria nossa corajosa reflexão, pois traz luz para fatos como o recente impasse na Universidade de São Paulo (USP) e, de resto, o macroimpasse educacional brasileiro, em que economistas se graduam sem entender "regra de três", médicos não sabem o que faz o "figo" e advogados se referem a "Vossa Eiscelenssia".

Empacada como está, a educação brasileira nem merece esse nome. É uma fábrica de desencorajados

O mal está na raiz. Uma sociedade permissiva e perdulária, corrompida pelo exemplo inominável de sua classe política, e cercada por cenas de violência, transformou a escola básica em centro de distribuição de merenda e encontro casual de alunos neuróticos e professores nervosos (ou será o contrário?). A conclusão simplificada do comentário "abre-cabeças" de Nicolelis é que de nada adianta colocar mais dinheiro em obra torta. O problema não é de verba, mas de verbo. Verbo aprender. Se nossos alunos tentam aprender o que não interessa, a motivação se esvai na entrada da sala de aula. Os currículos, desde a educação básica, deveriam sofrer uma demolidora mudança. Recomeçar do zero seria o desafio, com propósito totalmente distinto do academicismo atual, quase pondo professores em pé de igualdade com alunos na tarefa de aprender.

O sistema deveria se tornar sadiamente competitivo, no sentido de premiar resultados práticos e aferíveis. Um choque de informatização escolar (grande meta frustrada do governo Lula no seu segundo mandato) deveria acompanhar os novos currículos, com conteúdos elaborados por brasileiros de grande projeção em suas respectivas atividades e, em seguida, monitorados eletronicamente pelos "gestores de formação", como seriam chamados os professores do futuro.

Tal revolução teria o objetivo de subverter o sistema atual, eliminando sua total ineficiência, e evitando que o Brasil ainda demore até o ano 2256 - segundo cálculos de Viviane Senna, diretora do Instituto Airton Senna - "para chegar com sua 8a série ao nível dos atuais países desenvolvidos" (ÉPOCA, 25/5/09, página 90 - Brasil, Educação 2020).

Empacada como está, a educação brasileira nem merece esse nome. É uma fábrica de desencorajados e, portanto, propensos à depressão, às patologias psicossomáticas precoces e, óbvio, à violência fútil como ferramenta de solução dos dilemas não trabalhados tempestivamente na sala de aula.

PAULO RABELLO DE CASTRO é palestrante em economia, conselheiro de empresas, autor de vários livros, entre eles A grande bolha de Wall Street. Mantém o Blog da Bolha (blogdabolha.com.br) e escreve quinzenalmente em ÉPOCA

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