terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

A SOCIEDADE NÃO PODE ACEITAR A DESQUALIFICAÇÃO DOS PROFESSORES

As conclusões de certos órgãos de comunicação sobre os resultados da prova aplicada pelo governo de São Paulo aos professores temporários e candidatos à contratação temporária na rede estadual de ensino são, no mínimo, precipitadas e incongruentes. Os grandes jornais parecem mesmo ter eleito os professores como seus inimigos principais.

Estes jornais falam em “professores reprovados”, mas o que existe são duas listas de classificados para a atribuição de aulas de 2010: a primeira composta pelos professores que atingiram ou superaram a pontuação mínima definida pelo governo (considerando a nota da prova e parte do tempo de serviço) e, a segunda, com os professores que ficaram abaixo desta pontuação. Não existem aprovados ou reprovados neste processo, mas professores qualificados para a atribuição de aulas no primeiro momento e professores qualificados para o segundo momento da atribuição.

A falta de critério da mídia na cobertura deste assunto começa pelo fato de dizerem que metade dos professores foi reprovada, sem considerar que não existem 182 mil professores temporários na rede estadual de ensino. Existem cerca de 90 mil profissionais nesta situação. Quantos, entre os que não atingiram a pontuação, sequer pertencem à rede estadual de ensino, são estudantes ou, simplesmente, não fizeram a prova?

A diferença é própria da sociedade humana. Não somos todos iguais e, em processos de avaliação, nem todos se preparam da mesma forma, alguns possuem melhores condições que outros, lidam de forma diferente com as questões apresentadas e, assim, é natural que estas diferenças se reflitam nas notas obtidas.

A questão que se apresenta é sabermos qual é melhor política de formação para os professores. Para nós, esta política é aquela que assegure ao professor uma jornada de trabalho que permita a implementação da formação continuada no próprio local de trabalho.

Você, leitor, sabia que o professor da rede estadual de ensino de São Paulo paga sua formação e atualização profissional com recursos do próprio bolso? Sabia que os poucos programas de formação promovidos pelo governo estadual são restritivos, voltados apenas para parte dos efetivos e não para o conjunto dos professores? Sabia que os professores têm jornadas estafantes de trabalho, muitos em diversas escolas, devido aos baixos salários? Que são responsáveis por até 600 alunos, dependendo da disciplina que ministram, devido à superlotação das salas de aula? Como, então, avaliar professores aos quais não se garantem as mínimas condições para a sua formação e atualização profissional?

Além da formação continuada no local de trabalho, uma política de formação deveria contemplar, também, afastamentos remunerados dos professores para realizarem cursos de mestrado e doutorado, que revertem em melhoria da qualidade do ensino. Deveria prever, ainda, viagens dos professores (e até mesmo de grupos de alunos) dentro e fora do país. Imagine se um professor de História que esteja trabalhando com seus alunos a Inconfidência Mineira pudesse visitar a cidade de Vila Rica, vivenciando o contexto histórico dos acontecimentos e podendo degustar um pouco da cultura brasileira!

Há coisas simples que poderiam melhorar a educação pública no estado de São Paulo, e não chegaremos a estas soluções desqualificando os professores. Ao contrário, gostaríamos de parabenizar os professores, obrigados a participar desta prova imposta pelo governo, com extensa bibliografia, com muitos títulos esgotados, e com apenas um mês para estudar.

A denominada Escola de Formação criada pelo governo como mais uma etapa do concurso público não resolve o problema da formação do professor. As disparidades vão persistir e as conseqüências para a qualidade do ensino também.

Convidaríamos esses jornalistas e profissionais da mídia para trabalhar nas escolas estaduais durante 40 horas semanais, submetidos a toda sorte de violências e sem estrutura e, ao mesmo tempo, tendo que se submeter a esta prova nas condições que foram impostas aos professores. Uma prova complexa – como admitiu o próprio secretário da Educação – e, como já assinalamos, com bibliografia muito extensa; muitos títulos esgotados; e com apenas um mês para estudar, no final do ano, quando estivessem envolvidos em avaliações de alunos, reuniões de conselhos e, ainda, repondo aulas aos sábados, em decorrência da gripe suína. Será que teriam um aproveitamento melhor que o dos professores?

Se nossa categoria profissional fosse tão desqualificada como certos jornais querem fazer supor, haveria alunos da escola pública ingressando na USP, na Unicamp e em outras boas universidades; ou querem dizer que somente ricos estudam nestas instituições?

É preciso que o governo promova espaços de formação continuada do professor em seu próprio local de trabalho, trazendo para o interior das escolas as universidades públicas, através de convênios. Desta forma, as universidades não apenas proporcionariam aos professores uma formação continuada de qualidade, mas, também, alterariam a própria formação inicial dos docentes. Com uma proposta assim implementada estaremos unindo teoria e prática pedagógicas e aproximando a escola real da escola ideal.

Publicado por Maria Isabel Azevedo Noranha - Presidenta da APEOESP
http://apeoesp.wordpress.com/2010/02/01/a-sociedade-nao-pode-aceita...

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